Qualquer avanço – ou controle – do Estado sobre o cidadão é questionável. E nos três tempos verbais, passado, presente e futuro. Ratifica-se, essa intervenção legal sobre a vida cotidiana de cada um de nós, quando não se consegue o controle de determinado segmento social, ou mesmo do comportamento individual, para que direitos e deveres tenham o mesmo peso e caminhem lado a lado, sem que eu avance para o território do outro e vice-versa. Não gosto muito – aliás, não gosto nada mesmo – da máxima que estabelece que “meu direito termina onde começa o do meu próximo”, porque é sabido que há grupos afeitos a reivindicar mais direitos, buscando desobrigação aos deveres. Ou seja, “todos somos iguais perante a lei, mas alguns são mais iguais que os outros”. E quando esse Estado quer impor código de conduta ou de boas práticas de convivência, significa que nossas ações estão sendo tuteladas e vigiadas. E isso é invasão de privacidade. Monitorar o que eu devo ou não fazer dentro dos meus domínios significa instalar um “big brother” diuturno de minha porta para dentro. É confundir território privado com o espaço público. É inaceitável.
Da razão à loucura
Essa reflexão acima tem um significado. E, confesso, não gostaria de estar neste espaço discutindo o que vou expor a seguir, com base em matéria escrita pela jornalista Érica Samara da Silva e publicada na última quinta-feira nesta Gazeta. Não sei se me espanto ou se caio na mais profunda gargalhada, ao saber que “banho em fonte, bituca no chão e sacudir tapetes serão proibidos”. Pérolas políticas.
Obrigatório por lei
O comportamento do cidadão deve ser pautado pela boa conduta, pelo respeito ao seu semelhante e por ações que não comprometam seu convívio em sociedade. Isso, entretanto, não requer nenhuma lei específica. E nem perda de tempo em redigi-la e tomar espaço em pauta de sessão legislativa. Está na lista de deveres constitucionais e, portanto, tema de lei maior. Mesmo porque muitas proibições já existem em outras leis.
Dias Gomes revive
E não é que isso está acontecendo em Limeira? E não é que o prefeito Paulo Hadich (PSB) protocolou projeto de lei nesse sentido, na semana passada na Câmara Municipal? E por mais inteligentes que sejam as alegações contidas na sua redação e as explicações práticas dadas pelo seu chefe de Gabinete, Marco Aurélio Magalhães Farias Júnior, não deixam de provocar risos. É uma exposição desnecessária.
Código de estética
É o novo “Código de Posturas”, conforme foi batizado o projeto, muito bem explicado na matéria em questão. São 25 páginas de textos e as mais estranhas proposições que se tenham notícia nos anais do Legislativo Municipal. Fica proibido, portanto, sacudir tapetes em janelas e portas que dão acesso às vias públicas, varrer lixo para as ruas depositar resíduos e bitucas em logradouros públicos...
Outras providências
...estão proibidos, também, cuspir, urinar e defecar em áreas públicas e tomar banho em chafarizes e fontes; amarrar animais em postes ou árvores (John Wayne vive). Só para citar os mais pitorescos. E tem mais, até o tamanho do saco de lixo e como deve ser disposto para coleta faz parte do “Código de Posturas”. São ações naturais, e que não carecem regulamentação. Devem ser parte do comportamento humano.
Ironia não. Humor...
Desculpem-me se exagerei na ironia. É que um pouco de humor faz bem. E para refletir, nada melhor que abusar desse humor, para que não fiquemos à mercê de nossos pensamentos mais destrutivos. Mas me belisquem, pois tudo isso não deve ser verdade. Estou sonhando, ou em transe total. Mas é que é real. Os vereadores terão que apreciar o projeto. E aprová-lo, caso assim entendam necessário.
E ainda não é tudo
A justificativa: “visa, acima de tudo, estabelecer regras de convivência democrática e cidadã no espaço urbano, de forma que prevaleça o interesse coletivo”. Para isso, leis anteriores deverão ser revogadas para que tudo fique numa única legislação. A ideia não é ruim.
Faça o que eu falo...
...mas não faça o que faço. Ninguém, em sã consciência e até mesmo na insanidade mais profunda, é contrário à disciplina. A questão é quando essa disciplina chega como imposição do poder público, que dificilmente tem os melhores exemplos a serem mostrados. Só para que fique registrado e que não se trata de uma crítica gratuita, lembremos que da indisciplina do Poder Executivo para com suas obras e seus próprios. Esta mesma Gazeta mostrou, recentemente, o abandono do Palacete Tatuybi, que sediou a Câmara por mais de três décadas e faz parte de um complexo de valor histórico vem mostrando, há tempos, o desinteresse para a inauguração da nova Biblioteca Municipal, que já tem lugar amplo e confortável para recebê-la, mas ela continua em minúsculo espaço na área central. Só para citar dois exemplos.
E tem muito mais
Ainda no último domingo, mais um péssimo exemplo da conduta do poder público, também mostrado pela Gazeta, na antiga Machina São Paulo. Lixo, mato alto, início de construção se deteriorando sob as intempéries do tempo e muito dinheiro lá enterrado, em obra que terá uma outra destinação. E também não se sabe quando.
É importante sim
Não é preciso desmerecer a importância de mostrar ao cidadão que ele também é responsável para manter sua cidade limpa, bonita e bem cuidada. É preciso que isso não seja feito da forma como está sendo colocada. E, principalmente, por que pode cair naquele conhecido rol de legislações criadas, aprovadas, regulamentadas, mas nunca postas em prática. Em resumo, mais tempo perdido. E por nada.
Cobrada no carnê
Há ex-vereadores que juram que já existe uma taxa para manutenção para iluminação pública, embutida na cobrança do IPTU. E que uma nova cobrança seria bitributação. E que não há necessidade de nova contribuição a onerar ainda mais o bolso do contribuinte. Será que os atuais vereadores não conhecem a própria casa? Pois se, de fato, já há uma cobrança nesse sentido, faz-se necessário uma explicação coerente. Ou, então,se desminta essa informação.
Pressão sem razão
Apesar da iminência de ser votada este ano, para que possa valer já em 2015 é preciso que haja aprovação dos vereadores, a Contribuição para Serviços de Iluminação Pública, a Cosip, vai dar muita discussão ainda. Mas o pior exemplo vem do Poder Executivo, que tem bancado alguns secretários e, às vezes o próprio prefeito, a ameaçar com serviços precários e desinvestimento no setor, caso não seja aprovada. Vamos pôr os pingos nos “is”, isso beira a chantagem política. Todos estão na berlinda...
Pergunta rápida
Quem tem teto de vidro pode atirar pedras no vidro dos outros?
Leitura interessante
Quem gosta da história da TV e contada por quem é o maior responsável pela sua evolução não pode deixar de ler o Livro do Boni. Uma autobiografia de José Bonifácio de Oliveira Sobrinho, o grande mentor da evolução da TV Globo. Em capítulos especiais ele desenvolve o tema com a maestria de quem vivenciou cada passo dessa história. Numa das passagens mais interessantes do livro, Boni relata sobre uma das maiores revoluções da teledramaturgia brasileira. O processo de criação de “O Bem Amado”, de Dias Gomes, que foi a primeira telenovela a cores da TV brasileira, que faz um retrato caricato da política nacional, através do prefeito Odorico Paraguaçu e seu séquito na fictícia cidade de Sucupira.
Nota curtíssima
A história das falcatruas na Petrobrás é antiga. Podem perguntar ao Joel Rennó.
Frase da semana
“É como se fosse um Código de Ética do Cidadão limeirense”. Do chefe de Gabinete do prefeito, Marco Aurélio Magalhães Faria Júnior, sobre o projeto de lei do “Código de Posturas” enviado à Câmara. Na Gazeta de Limeira. Quinta-feira, 20.
domingo, 23 de novembro de 2014
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