Causa e consequência são irmãs gêmeas, separadas no nascimento. Às
vezes é mais fácil justificar a origem de uma situação, do que prevenir
seu próprio efeito. E quando isso acontece, não há como evitar o excesso
retórico de muitos ou a indignação de outros tantos. E nem controlar o
próprio impulso crítico, fechando os olhos sem querer enxergar a
realidade, que é dura e implacável, tanto para os réus como seus
algozes. Abster-se em analisar a história como um todo e não
fragmentada, é um exercício complicado, que invariavelmente vai
desembocar na hipocrisia, que passa a borracha no passado, açoda o
presente, para tirar benefícios no futuro.
Quem acompanha o julgamento da Ação Penal 470, batizado políticamente
de mensalão do PT, sem paixão ideológica, percebe uma febre que acometeu
muitos formadores de opinião, entre a mídia de um lado, e o
envolvimento político-partidário, do outro, que beira o fanatismo. Ao
radicalismo fundamentalista, que alimenta os hipócritas e a ignorância
política sem propósitos. Há muito tempo não se via uma interação dessa
natureza, clamando por justiça (ou seria justiçamento?), envolvendo
políticos da então base aliada do governo Lula, publicitários,
empresários e lobistas, naquilo que acabou se transformando num dos
maiores escândalos de compra de apoio político, que se tem notícia da
história recente do País. E que virou notícia. Sem entrar no mérito da
questão de cada voto proferido pelos ministros do Supremo Tribunal
Federal, criando no inconsciente popular heróis extremados e vilões
execrados, na condenação ou absolvição dos indiciados, o que todos
esperam é uma punição exemplar aos condenados. Mesmo que seja impossível
imaginar um ponto final na corrupção, há que se continuar no seu
combate.
Justamente o que não aconteceu, também em passado recente, quando
agentes palacianos arregimentavam (e que cada um entenda como quiser o
significado dessa palavra) parlamentares, pela aprovação da Emenda
Constitucional da reeleição para cargos de prefeito, governadores e
presidente da República, mas que tinha um endereço específico, a
recondução do tucano Fernando Henrique Cardoso ao cargo que já ocupava.
Que foi notícia à época, porém, não ganhou as dimensões ou mobilização
suficientes, para levar ao banco dos réus, corruptores e corruptos, que
saíram ilesos. Muitos deles ainda gravitam em palácios governamentais
com pompa e agora travestidos de paladinos da ética, exigindo cabeças,
que poderiam ser as deles próprios. Casos assemelhados, tratados de
forma distinta. E se alguém pensa que mensalões, mensalinhos ou qualquer
que seja o nome de batismo que tiverem, acabam nesse julgamento, está
enganado. Eles continuam, como aconteceu lá atrás, e se fez vistas
grossas. Disfarçados em outras fórmulas, nos municípios, estados e
Federação, malas-pretas, cuecas recheadas e dinheiro vivo em envelopes
ainda resistem às barganhas políticas. O que se espera é que a justiça
feita hoje (a mesma que deveria ter sido feita lá atrás) iniba novas
transações nos esgotos da política
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