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terça-feira, 6 de março de 2012

Uma história que precisa ser recontada

No próximo mês de abril, o País começa a passar a limpo um dos períodos mais negros de sua história política: a ditadura militar, entre 1964 e 1985, responsavel por 475 mortos, dos quais 163 ainda estão desaparecidos. Isso, quase 30 anos depois do fim dos anos de chumbo. Será finalmente instalada, a Comissão da Verdade, instituída pelo governo federal, para apurar as mortes ocorridas nesse período. Ainda pairam muitas dúvidas, mas a certeza é de que o Brasil só vai conseguir respirar uma democracia de fato, assim que todas as respostas forem conhecidas. Doa na consciência de quem doer.
Ainda resta uma mácula nesse processo todo. Apesar do nome forte, a Comissão da Verdade não tem poder punitivo e nem de recomendação, para que os verdadeiros culpados possam prestar contas à Justiça. Mesmo sem esse poder, e sabendo dos efeitos da anistia "ampla, geral e irrestrita", assinada no governo do general João Figueiredo (último militar a comandar a Nação) militares da reserva se insurgem contra essa investigação e, acobertados ou amparados por clubes militares e outros interesses, põem sob suspeita esse exercício de cidadania, que, espera-se, seja praticado na sua plenitude. É preciso dar, em especial às famílias que ainda não puderam sepultar os seus mortos, o conforto necessário de, ao menos, saber o que aconteceu e qual o paradeiro de cada um deles. Se insurgem, alguns generais de pijama, pois sabem que se encontram entre eles, ainda, muitos dos responsáveis pelo terrorismo de Estado, que tomou conta da Nação a paritr daquele 31 de março. E não querem manchar a farda, que deveriam honrar na proteção do cidadão, e não eliminando-os, porque pensavam diferente.
É fato que todas as versões oficiais da época já estão sendo confrontadas. Várias foram modificadas e a verdade vem garantindo um reparo, pelo menos financeiro, por parte do próprio Estado, num reconhecimento aos crimes cometidos por agentes públicos em nome da segurança nacional e, pasmem, da democracia. Entre as versões já desmistificadas, está a do suicídio do jornalista Vladmir Herzog nos porões do Doi-Codi. Outra, que começa a ser recontada, é a da captura e morte de Carlos Marighella, executado pelos comandados do então delegado Sérgio Armando Paranhos Fleury, que armaram a farsa para simular improvável reação.
Muita gente ainda resiste à história, acreditando que do outro lado havia apenas assassinos e sequestradores. É irrefutável, porém, que se eles assim agiam é porque foram empurrados para essa condição, pois estavam alijados de participar e contestar o golpe e o regime, pela via política, nas tribunas do Congresso, na mídia - que sofria censura rigorosa - e outros meios legais de participação popular. Se, diferente de Argentina, Uruguai e Chile, por aqui os torturadores e seus superiores não chegarão aos tribunais, espera-se que suas identidades se tornem públicas. É preciso, de uma vez por todas, recontar a história através de seus verdadeiros personagens.

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