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quarta-feira, 17 de agosto de 2011

Rottweilers e vira-latas

Quase duas mil pessoas presas até a última sexta-feira, 12, em toda a Inglaterra. Manifestações violentas cercaram os arredores do Estádio Olímpico de Londres, que será palco da abertura da Olimpíada em julho do ano que vem. Situação que vem desde os primeiros dias de agosto. Quebra-quebra, incêndios e tudo a que se tem direito numa revolta popular. E a capital inglesa foi a mais afetada pelos protestos, que teve início com a morte suspeita de um traficante negro pela conhecida força policial britânica, a Scotland Yard. A sucessão de ondas violentas envolveu, posteriormente, brancos, judeus, muçulmanos, indianos e tantas outras etnias, que resultou em imagens chocantes e nada dignas de um país desenvolvido e civilizado.
Um leitor mais atento pode me perguntar por que esse prólogo, envolvendo uma nação tão distante, se o Brasil tem seus próprios problemas e o ódio racial também se alastra por aqui? Talvez em menor escala e mais velado, mas real? A ideia não é tratar da violência e nem mesmo das questões sociais que envolvem os dois países. O propósito é escancarar outro tipo de preconceito. Tanto externo das outras nações - em especial as ditas desenvolvidas e socialmente avançadas - para com o Brasil, como também o interno, que nos faz portadores indeléveis do chamado "complexo de vira-latas".
Ponteia-se aqui e ali, entre leigos e especialistas, uma dúvida feroz quanto à capacidade de o País realizar a Copa do Mundo de 2014 e os Jogos Olímpicos de 2016, como se tudo fosse permitido às demais nações e o Brasil nunca fosse merecedor ou competente para tais empreitadas. Uma verdadeira síndrome do "rabo entre as pernas", fazendo loas ao que está - ou vem de - fora, num achincalhamento total e irrestrito à terra que lhes o sustento, como se tudo por aqui não tivesse valor. Ora, tamanha pobreza de espírito é retrato da exteriorização completa e desnuda desse complexo, cunhado pelo jornalista e teatrólogo Nelson Rodrigues, na década de 1950, após a derrota do Brasil para o Uruguai em pleno Maracanã, na Copa do Mundo.
Assim como a Europa branca tripudiava sobre a Copa na África do Sul, tripudia-se agora sobre a Brasil. Enquanto nações milenares estão à beira de um abismo econômico sob seus pés, estamos ancorados num porto um pouco mais seguro, que até o momento tem resistido aos abalos financeiros externos. Somos vulneráveis ainda. Não tenho dúvida disso, porém nosso chão ainda é firme. Os protestos no Reino Unido estão situados a um ano da Olimpíada. Ninguém fez voz contra e nem contestou a capacidade inglesa de realizar os jogos nesse clima. A conclusão dessa história, se alguém ainda não percebeu, é simples e se resume a uma única pergunta: e se tudo isso estivesse acontecendo por aqui, às vésperas de um evento mundial?

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