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domingo, 12 de janeiro de 2014

Cabeças cortadas, lagosta e galinha crua

Peço licença ao meu leitor, que está acostumado a me ver tratando de temas locais na maioria dos meus escritos, porém, não posso deixar de registrar um dos maiores absurdos, dos tantos que vemos, diariamente, da vida política deste país. Enquanto as redes sociais exibem filmes com cabeças cortadas dentro dos presídios do Maranhão e o sistema carcerário daquele Estado (feudo da família Sarney), caminha para o caos – se já não estiver nele – a governadora Roseana Sarney (PMDB) abriu licitação para compra de lagosta, camarão e outras iguarias para o Palácio do Governo, notícia que ganhou a mídia na última quarta-feira, após revelação da coluna Painel, da Folha de S. Paulo. E gerou, de imediato, um mal-estar político de proporções incalculáveis, a partir das redes sociais. Na quinta-feira, o constrangimento da notícia obrigou a filha de José Sarney a cancelar essa licitação. Enquanto isso, novas revelações davam conta da comida servida nos presídios de lá: arroz e galinha. Segundo os presos, crua. Uma situação surreal num estado surreal, dirigido por uma família muito real.  

Insulto à civilidade
Mais do que um desgoverno, essa situação revela como falta muito, ainda, a este país, para controlar as ações de alguns políticos, que se julgam – e agem como tal – donos dos destinos de cada cidadão. E dão de ombros à opinião pública, quando resolvem expor suas vontades. O Maranhão, por conta desse feudo que se tornou, é um Estados mais atrasados do Brasil. Seus indicadores sociais mostram isso.

Donatário Sarney

A família Sarney se tornou “dona” do Estado e, como tal, se sente muito à vontade para patrocinar aberrações dessa natureza. Em pleno Século XXI, o coronelato ainda impera naquela unidade da federação e, o que é pior, está longe de ter um fim, como aconteceu com o “carlismo” – adjetivo referente ao domínio do clã de Antônio Carlos Magalhães, o ACM. Lembra a antiga divisão das capitanias hereditárias.

A força midiática  
Mais uma vez está demonstrada a importância do papel da imprensa, que, quando bem intencionada e no cumprimento de seu verdadeiro papel, consegue restaurar o caminho da dignidade, usurpado por clãs medievais, que ainda compõem a estrutura política brasileira. Os Sarney, no Maranhão, são um exemplo clássico dessa postura. Para quem desdenha dessa força, esse é outro exemplo que entra para a história do jornalismo.  

Leitura oportuna
“Honoráveis bandidos – Um retrato do Brasil na Era Sarney”. Para quem quiser conhecer um pouco mais da história política maranhense, indico esse livro, de autoria do jornalista Palmério Dória.

E para finalizar...

... a história, uma outra licitação da Sarney governadora: uísque, caviar e champanhe. Dessa ainda não se tem notícia de cancelamento. Mas para destacar ainda mais o absurdo político deste país, José Sarney continua dando suas cartas no governo federal. E vamos rememorar: assumiu a presidência da República de graça, com a morte de Tancredo Neves. Antes foi capacho da ditadura militar. Depois passou pelo curto governo Collor e Itamar, nadou de braçada nos oito anos do tucano Fernando Henrique Cardoso, mais oito no governo Lula e agora completando o quarto, no governo Dilma. Que ninguém duvide que ele continuará no próximo governo. Seja quem for o eleito, Sarney fica.

Franguinho caro
Chega de Sarney, agora. Vamos retomar Limeira e suas contradições. E nem bem o ano começou e o governo de Paulo Hadich (PSB) já contabiliza uma nova e séria denúncia de sobrepreço na merenda escolar, agora municipalizada. Denúncia foi feita pelo vereador José Roberto Bernardo, o Zé da Mix (PSD), na última quinta-feira. Com direito a coletiva e tudo mais. Tem muita gente rindo à toa, nessa história toda.

Perdendo o senso
Há um porém. Os mais afoitos, cujos interesses são apenas políticos, e não o bem-estar do Município, já estão comemorando a denúncia sem dar chance ao contraditório. É bom lembrá-los de que que, até se chegar à condenação da merenda terceirizada de Félix, foi um longo caminho percorrido pelo Ministério Público e pelo Judiciário. Um pouco menos de empolgação, e pé no chão, também fazem parte do jogo político.

Pergunta rápida
A oposição política em Limeira tem, de fato, um líder que possa falar por ela?

Triste intolerância
Tenho acompanhado muitas discussões pela mídia convencional, e também nas redes sociais, especialmente as políticas, que invariavelmente terminam num ponto que todos nós, democratas e republicamos, mais repudiamos: a intolerância, que leva ao ódio. Pode-se discordar de tudo e de todos, de posicionamentos políticos e de coloração partidária ou ideológica. Não se pode, porém, a pretexto de um falso moralismo ou de uma ética fajuta, querer direcionar as opiniões, suprimindo de outrem o direito de também expressá-las. Tem muita gente que usa da hipocrisia para arrotar democracia. Não conseguem levar adiante o bom debate, quando confrontados com a inteligência.

Nota curtíssima
O vereador Zé da Mix, hoje, é o vereador Ronei Mantins, de ontem.

Ele irritou geral
O vereador Ronei Martins (PT), presidente da Câmara de Limeira, atraiu a ira de seus desafetos políticos ao assumir-se favorável à "vaquinha" proposta por familiares do ex-deputado José Genoino, para o pagamento da multa condenatória imposta pelo STF na questão do mensalão. Nunca se viu uma reação tão violenta, pela posição pública de um político. Por mais impopular que seja tal postura, Ronei não fugiu ao chamado de sua história de militância. Pode-se não concordar com ele, mas que foi corajoso, isso foi.

Frase da semana
“Contei 180 furos no meu filho”. Domingos Pereira Coelho, pai de um preso esfaqueado e decapitado no CDP de Pedrinhas, no Maranhão, em rebelião ocorrida em dezembro. Sexta-feira, 10, na Folha de S. Paulo.

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