Lendo a matéria sobre os Anjos da Noite, da jornalista Daíza Lacerda (Pessoas de sucesso podem se tornar moradores de rua), publicada por esta Gazeta na edição do último domingo, é preciso, antes de tudo, atentar para a importância do trabalho voluntário. Compreender a dedicação do tempo livre ou até mesmo o sacrifício do descanso, para dar um pouco de conforto aos desvalidos da vida. Sair do aconchego de um lar, numa noite fria, para alimentar e dar esperanças - a melhor de todas as alimentações, porque aquece a alma - para o reencontro com o caminho perdido lá atrás, por algum motivo qualquer, ultrapassa todas as dimensões do voluntariado. Dá à pessoa que coloca na prática tais atos, um status de abnegação e despojamento da própria vida.
Dar à opinião pública o testemunho de missões dessa natureza, sejam elas de cunho religioso ou apenas social, como fez a jornalista, além de trazer à luz seus “ocultos” praticantes, desnuda a falta de políticas sociais do poder público, para dar o devido encaminhamento às pessoas que perderam tudo na vida. Até a dignidade de serem tratadas como seres humanos. É a parte triste desse trabalho. Se alimentar um faminto, aquecer aquele que passa frio ou levar uma palavra de alento a quem o desespero é a companhia de todos os dias, trazem paz e alegria desinteressadas a esses guerreiros do bem, perceber que a sarjeta é a casa de muita gente é a realidade que eles têm que enfrentar. Chegar a tal situação, escandalosamente degradante, é muito mais fácil que imaginamos. Sair dela é o grande desafio.
Superar as mazelas que a vida nos prepara, requer a mão estendida, que somente os voluntários - como Betinho e William Semprebom, os verdadeiros “anjos da noite” - sabem apresentar. Essa é a sensibilidade que falta às autoridades, quando precisam enfrentar situações dessa natureza. É o caniço que falta para o ensino da pesca. As ações públicas são apenas assistencialistas, longe das reais necessidades de quem chegou ao fundo do poço e até um pouco mais abaixo. É a diferença que separa as intenções voluntárias de intenções políticas, que vislumbram apenas o número, que um título de eleitor pode representar.
Mais que elogiar o trabalho desses incansáveis resgatadores de almas é preciso refletir sobre a ausência do Estado em ações mínimas. O único esforço, nesse sentido, é ser humano, na sua verdadeira condição humana e entender o que vai pela noite adentro. E que a carícia da palavra é mais importante que uma passagem de volta. Longe das turbulências familiares, do degredo das drogas e da desilusão com a própria vida, poucos conseguem de fato a verdadeira compreensão daqueles que hoje têm apenas as ruas como abrigo. A opção voluntária é para poucos. Só para os muito bons!
terça-feira, 12 de julho de 2011
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